quinta-feira, 3 de junho de 2004

Porque

Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.

Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.

[Sophia de Mello Breyner Andersen]

Às vezes tenho a certeza que quero continuar a acreditar nesta espécie de ingenuidade crítica, que torna a passagem pelo mundo menos confortavel e mais autêntica!
porque os outros são os outros e eu não.

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