Último jantar entre caixas e caixotes.
Último serão em frente à televisão na sala que tem portas cor de laranja.
Última noite na minha cama, na imensidão do quarto da parede vermelha.
A minha tralha não cabe no sitio onde vou morar. Lá não há quarto de vestir nem uma casa de banho desenhada por mim, com janela e chuva na banheira. Lá não há pátio para as minhas plantas crescerem. O chão não é de madeira velha, as janelas não têm portadas, as portas são todas iguais.
O meu eu não cabe no sitio onde vou morar.
Po cá ficam metade das coisas que também eram minhas. Fica a oliveira que esteve outrora morta. Fica um espaço de sonhos e projectos falhados.
E assim do nada vem-me à memória o dia em que para cá me mudei. E penso como é possível que em menos de dois anos esta casa, com os seus detalhes e o sítio onde está, se tenha tornado tanto no meu espaço.